segunda-feira, 31 de maio de 2010

Pré roteiro para a peça.

O palco está escuro e as sombras apenas insinuam o que há nele. Aos poucos, a luz vai se abrindo num facho que acompanha o ritmo de “The End”, até se centrar no homem que está com uma arma na mão. Ele aponta a própria cabeça, mas olha pra plateia de um jeito cruel e dispara a arma na direção deles.

- Sem balas! Que tipo de mestre de cerimônias eu seria se matasse a plateia? Todos mereceram estar aqui, pagaram por isso.

O facho de luz vai afinando e o acompanha até o centro do palco, onde se pode ver uma cadeira defronte a um caixão ele olha, sorri e se senta.

- Sejam todos bem-vindos. Putz! Não pensei que viria tanta gente... A desgraça dos outros é divertida, né? (risinho sacana) Tudo bem, vieram atrás do show? Terão um.
Ele aponta para o caixão com um sorriso de contentamento.
-É um belo brinquedo, não? E é todo meu... Eu paguei. Sabe o que me diverte? Sempre me perguntam qual parente vou enterrar, mas todos riem quando digo: “O Sonho”. (Ele faz silencio por um tempo) Viu? Nem vocês entendem. Hã... Porque vieram, então? É divertido ver o “cara que vai morrer?” Ah, vocês pagam... Porque eu deveria me importar?

Cheguei à cidade mês passado, queria me esconder, fugir de mim mesmo, ser diferente, mas... Ah, droga... Sou Gay! Não demorou muito para que meus “desejos” chamassem atenção do “Homem Comum”. Sem ofensa, claro? Não me importo de ser chamado assim... Ah, “Homem comum” soa ofensivo? É...? E daí?

(A iluminação vai ficando mais onírica)

Sabe que já tentei “me curar?” Gosto de meninos desde que me lembro, ainda assim, tentei... Vesti minha pele de leopardo e fui “a caça”. Hábitos estranhos... O mundo visto através das luzes hipnóticas de uma “Rave”, procurando o melhor do improvável, tentando encontrar o que interessava aos homens e o melhor dentro disso.
Deparei com a “rainha da dança”. Linda, olhos verdes, ruiva, corpo de modelo... Atraente até para mim. Não consegui resistir, precisava tê-la. Seria meu “rito de passagem”. A troca de sorrisos foi à chave para o resto da noite. Imagens em câmera lenta se justapondo, como num comercial de drogas. Bem, algumas foram usadas, mas nenhum sangue de animal foi derramado no processo.
Fomos para o seu apartamento, não para o meu. Meus pôsteres da Tori Amos, Barbra Straisend e as outras cantoras maravilhosas dariam “bandeira”. Decorei todo o roteiro e engoli até o nojo. Foi bom... Não, foi maravilhoso. Só não era a minha praia. Bem, ainda assim ficamos um tempo considerável...

(Ele abaixa a cabeça, coloca as mãos sobre ela e sorri).

Eu me apaixonei! (começa a gargalhar) Acredita nisso? Meu, sou veado de carteirinha. (olha pra plateia) Ta duvidando, é? Ta aqui!!!! E assinada pelo Luiz Mott! (Ele olha para a carteirinha, faz uma careta e a joga longe) Quem? Só faz diferença pros “entendidos”, né?  Eu também percebi isso...
Onde eu estava...? Ah, sim... Afrodite, Vênus, Lakshimi ou qualquer que seja o nome dela. Nunca soube. Precisava? Noites de sexo e paixão heterossexuais. O pedido da mamãe. Achei a felicidade numa caixinha de cereais e passei a adotá-la.
Todas as coisas boas...
Ela morreu... Da “maldita”. Saudades do tempo que se tratava de uma “peste gay”. Eu e ela nos cruzamos na contramão. Tinha de ser. Só me pergunto uma coisa: “É justo?” Não faz diferença, é história. A minha.
Irônico, de uma forma doentia. Tentei “me curar” pra fugir dela também. Não apenas para partilhar a felicidade do “Homem Comum”.

(Ele se levanta e vai em direção da plateia)

Quer saber? Se um bando de planárias tomasse o poder, seriamos mais felizes. Olhe para vocês... O que realmente fazem das suas vidas? Quantos podem dizer que realmente estão felizes com o que são? O homem comum...
Quando garoto, meu pai me surrava tanto que muitos achavam que eu jamais chegaria aos 20 anos. Bem, se tivessem apostado mais dez anos...
Um de meus piores pesadelos é com um menino retardado o pai arrancou o olho.  Poderia ter sido eu. Agradeço e me entristeço. Sou “Homo”, certo? Ainda choro quando penso nele.
Meu pai era um bom homem, mas assim como meu avô, aprendeu que a vida girava ao longo de seus testículos.  O “Homem comum”.
Sempre o maldito “Homem comum” e suas limitações. Será que ele nunca vai crescer?

(Ele se aproxima mais da plateia e aponta para um espectador, que tem que ser da trupe, senão o ator apanha feio! Ele e o espectador ficam frente a frente e o fulano tem de dar a ideia de surpresa enquanto o ator circundá-lo).

Eis o homem comum! Algo diferente? O macho alfa de sua espécie, pronto para mandar e colocar uma ordem que mais parece uma prótese peniana, sem o qual sua virilidade seria ameaçada. Que tipo de criatura circunda o próprio “pau” e se sente feliz? O macaco que caiu e nunca soube voltar para a árvore! Será que Darwin estava errado e descendemos dos jumentos? Bem dizem que muitos têm “preguiça de pensar”. Seria um erro? 

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